"Os olhos semicerrados de
Lídia seguiam o pensamento vago e indeciso. O fio quebrava-se, havia sombras
interpostas como nuvens. Depois, aparecia nítido e claro, para logo se sumir
entre véus e surdir mais longe. Era como a ave ferida que rasteja, esvoaça,
aparece e desaparece, até cair morta. Incapaz de sustentar o pensamento acima
das nuvens que o toldavam, Lídia adormeceu". José Saramago
A forma poética utilizada por
Saramago para descrever o momento em que o sono chega, a delicadeza de cada
palavra, toda essa preciosidade narrativa remeteu-me de imediato a uma fala da
Helena, uma fala simples, com a mesma temática:
- Mãe, quando estou na cama, um
pouquinho antes de dormir de verdade, vejo um monte de coisas aqui na frente assim
ó... – disse movimentando as mãozinhas em frente aos olhos.
- Ah, é? Que coisas tu vês,
filhota?
- Muitas coisas: casas, prédios,
nuvens, pessoas...
Com toda a propriedade
intelectual de uma criança de quatro anos, com a poesia iminente da sabedoria
infantil, teceu um comentário e me surpreendeu pelo fato de prestar atenção
neste momento em que o corpo de desliga da mente. É a poesia que
vive e brota nas falas infantis! Um dia ela também vai ler Saramago!
- Bianca Velloso -
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