quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Dez a zero para Helena

Helena não gosta de brincar sozinha. Insiste o tempo todo para que eu brinque junto. Adoro brincar com ela, mas, muitas vezes tenho os meus afazeres. Dia desses, numa dessas discussões, ela insistia:
- Mãe, vem brincar comigo!

- Brinca um pouco sozinha para eu lavar a louça!

- Ah não! Eu não gosto de brincar sozinha! Brinca comigo!

- Espera um pouco, deixa eu lavar a louça, depois eu brinco!

- Brinca agora!

Eu sou uma manteiga, e se ela insiste um pouquinho não resisto:

- Tudo bem, mas não é assim, não é neste tom de voz. Tem que pedir com carinho e por favor!

- Por favor, mãe, brinca comigo agora? Lava a louça depois que eu for para a escola...

Quando ela vai para a escola eu tenho que ir para a loja, mas tudo bem. Então ela me deu uma boneca e pegou mais duas:

- Tu tens uma filha e eu tenho duas, tá, mãe?

- Tá bom!

Colocou as bonecas das quais era mãe num canto da sala e veio conversar comigo:

- Oi, amiga!

- Oi! Ué, cadê as tuas filhas?

- Estão lá brincando...

- Ah é? Elas brincam sozinhas?

- Brincam, brincam!

- Que legal! A minha filha não brinca sozinha! Não tem jeito! Eu tenho que brincar com ela o tempo todo! - Helena só me olhava calada, séria - Me diz, amiga, o que eu faço para que a minha filha brinque sozinha também?

- Dá uma irmã pra ela!

Aguçando o paladar

Nossos cachorros ficam muito irritados quando chove. Estávamos a mais de uma semana abaixo de chuva aqui na Ilha de Santa Catarina. Os bichinhos estavam agitadíssimos. Helena e eu, para variar, brincávamos de escola na sala e comentávamos:

- O Cok e a Dike estão muito agitados, né, filha?

- Por quê, mãe?

- Deve ser porque eles não gostam de chuva, ficam irritados. Nem a gente aguenta mais a chuva, imagina eles ali no pátio, né?

- Tive uma ideia! Já sei como a gente pode fazer para que eles fiquem quietos, mãe!

- Como, filhota?

- Eu vou dar biscoito para eles!

- Boa ideia, meu amor!

Foi sozinha até a despensa, pegou o pacote de biscoito para cachorro que estava quase cheio e saiu para oferecer aos bichos. Aproveitei para ficar na sala organizando algumas coisas. Alguns minutos depois ela entra falando:

- Mãe, tem que comprar mais biscoito pra eles! Esse pacote acabou!

- Não acredito que tu deste todos os biscoitos para eles! Tá bom, amanhã a gente compra! - falei de costas, ainda terminando de juntar uns desenhos espalhados pela sala. Quando direcionei o olhar para minha filha não sabia se ria ou se dava bronca. Com o pacote na mão, tinha a boca, o rosto e a roupa repletos de farelo, como se ela tivesse virado a embalagem para comer o restinho:

- Helena! - com um tom de voz mais duro. - Tu comeste o biscoito dos cachorros?

- Só o farelinho...

Caimos na gargalhada - nós duas!

Sobre números e quantidade

Depois de descobrir as letras e estar quase entendendo a formação dos fonemas, Helena começa a desvendar os números e o que eles representam enquanto quantidade. Passa o dia inteiro contando:

- Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez, onze, doze, treze, catorze, quinze, dezesseis, dezessete, dezoito, dezenove, trinta, trinta e um, trinta e dois... - assim mesmo, do dezenove pula para o trinta!

Estende os dedinhos e me pede para contar - dois na mão direita mais um na mão esquerda:

- Conta, mãe!

- Um, dois, três!

Três na mão direita mais três na mão esquerda:

- E agora, mãe?

- Um, dois, três, quatro, cinco, seis!

Diariamente me pede para responder:

- Cinco anos ainda é criança, mãe?

- É, filha!

- E seis?

- Também!

- E dez?

- É criança ainda!

- E treze?

- Treze é adolescente!

- E quinze?

- Adolescente também!

- E dezoito?

- Com dezoito começa a ficar adulto...

- Onde eu vou estudar quando tiver dez anos?

- No ensino fundamental.

- E quando tiver quinze anos?

- No ensino médio.

- E quando tiver dezoito?

- Na universidade.

Hoje fomos assistir à apresentação do grupo Gira Coro na Universidade Federal de Santa Catarina. Não é muito fácil convencê-la a sair. Por ela fica o dia inteiro em casa brincando de escola (sempre a mesma brincadeira). É preciso prepará-la psicologicamente desde cedo. De manhã fiz o convite:

- Filha, vamos a um show hoje de noite?

- Vamos!

- Legal, então eu vou te buscar mais cedo na escola e nós vamos direto para o show.

- Tá bom! É música, mãe?

- É, filha, é música sim!

- Onde vai ser?

- Vai ser lá na universidade onde a Tata estuda.

- Mãe? - pensei que ela me faria uma pergunta relacionada ainda ao show.

- Fala, filhota!

- Quantos anos a Tata tem? Dezoito?

A Tata é minha querida amiga Marta Magda, que foi minha professora quando eu tinha dez anos de idade, portanto tem pelo menos uns quinze a mais do que eu.


segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Japão

Helena descobriu esses dias que quando aqui no Brasil é dia, lá no japão é noite e vice-versa. Agora a maioria das brincadeiras está incluindo o Japão. Por conta disso, o Val a presenteou com um quimono salpicado de letras japonesas.


De noite, na hora de dormir, sempre conversamos um pouquinho na cama. Ontem a conversa começou pelos cachorros:

- Mãe, por que nós não temos medo do "Coc" e da "Dike"?

- Porque eles são nossos cachorros, nós somos as donas deles!

- Na verdade eu sou a dona da "Dike" e a tia Calaca é dona do "Coc", né, mãe?

- É, filha!

- E a gente cuida do "Coc" porque a tia Calaca está morando lá na França, né, mãe?

- Uhum! - não queria esticar muito o assunto, já estava ficando tarde e queria que ela dormisse logo. Então me comunicou:

- Quando eu crescer vou morar lá no Japão. Aí tu podes cuidar da Dike pra mim, mãe?

Peras

Alguns dias atrás meu irmão, que é padrinho da Helena, esteve aqui em casa. Havíamos comprado peras e ele pediu:

- Posso levar uma perinha para casa?

Helena não deixou ninguém responder e foi logo avisando:

- Mas só uma, porque a minha mãe gosta de pera!

Arnaldo Antunes

Arnaldo Antunes é, entre todos, o meu cantor preferido. As letras que ele compõe são completamente compatíveis com o meu pensamento, minha ideologia, minhas viagens intelectuais e sentimentais... Por isso é lógico que faço de tudo para que a Helena também goste. E ela gosta, curte muito a música "Num dia". 

Semana passada ele fez um show aqui em Floripa. Tarde da noite, numa casa de shows localizada às margens da SC 401 (rodovia que dá acesso às praias do norte da ilha). Durante o dia escutamos alguns dos cds que tenho aqui em casa. Helena adorou, deu risada, dançou.

Na hora do show ela resmungou um pouco, pois queria ir junto:

- Não dá, filha, é só para adultos, mas eu vou pedir pra ele fazer um show para crianças.

- Mas eu quero ir junto, mãe!

- Não dá, Helê, mas eu digo para ele que mandaste um beijo, tá bom?

- Tá bom! E diz também que eu amo ele, tá, mãe?

- Pode deixar que eu digo!

Hoje, no meio da brincadeira, ela me contou que quando tiver um nenezinho vai batiza-lo de Arnaldo!