sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Do momento em que o sono chega

"Os olhos semicerrados de Lídia seguiam o pensamento vago e indeciso. O fio quebrava-se, havia sombras interpostas como nuvens. Depois, aparecia nítido e claro, para logo se sumir entre véus e surdir mais longe. Era como a ave ferida que rasteja, esvoaça, aparece e desaparece, até cair morta. Incapaz de sustentar o pensamento acima das nuvens que o toldavam, Lídia adormeceu". José Saramago

A forma poética utilizada por Saramago para descrever o momento em que o sono chega, a delicadeza de cada palavra, toda essa preciosidade narrativa remeteu-me de imediato a uma fala da Helena, uma fala simples, com a mesma temática:

- Mãe, quando estou na cama, um pouquinho antes de dormir de verdade, vejo um monte de coisas aqui na frente assim ó... – disse movimentando as mãozinhas em frente aos olhos.

- Ah, é? Que coisas tu vês, filhota?

- Muitas coisas: casas, prédios, nuvens, pessoas... 

Com toda a propriedade intelectual de uma criança de quatro anos, com a poesia iminente da sabedoria infantil, teceu um comentário e me surpreendeu pelo fato de prestar atenção neste momento em que o corpo de desliga da mente. É a poesia que vive e brota nas falas infantis! Um dia ela também vai ler Saramago!

- Bianca Velloso - 

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