Minha mãe tinha o riso frouxo, ria até doer a barriga, até chorar, até fazer xixi nas calças. E eu ria junto, do mesmo jeito. Uma das melhores coisas que fiz na vida foi ajudar minha mãe realizar um sonho: voar de parapente. Ela tinha 72 anos quando dei de presente a ela o voo. Eu nem imaginava que só teria mais três anos com ela. Imaginava que ela viveria até uns 95.
Hoje é como se ela ainda estivesse aqui, mesmo sem a presença física, sem as conversas, os abraços... A presença dela está comigo porque o amor não morre, o amor fica. Toda hora me pego pensando: "minha mãe estaria orgulhosa disso, minha mãe precisava ter visto isso, minha mãe gostaria dessa comida..." Engraçado essa coisa das comidas, minha mãe adorava comer e era muito bom cozinhar pra ela, antes de sentar à mesa olhava e dizia: "hum, chega a dar dorzinha". Tem algumas comidas que eu gosto muito mais do que gostava antes porque são comidas que ela adorava e comer essas comidas é sentir a presença da minha mãe. Tem muita comida que ela gostava e eu não, dessas eu continuo não gostando, porque minha mãe gostava de tudo e eu sou meio chata para comer, mas aquelas que eu gostava um pouquinho e ela gostava muito, hoje eu gosto mais.
Lidar com o luto é um aprendizado diário. É dolorido. Mas é bonito também, porque é perceber que o amor não morre nunca. E talvez essa seja a vida eterna: o amor que a gente deixa e que vai passando de geração em geração. Para mim isso é Deus: o amor que nos conecta enquanto humanidade e natureza, a parte mais bonita da vida. No meu modo de ver as religiões são metáforas que nos ajudam a perceber que a existência só faz sentido quando percebemos que há uma conexão profunda entre as gentes, a natureza e o mundo.
(Bianca Velloso)
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